terça-feira, 11 de maio de 2010

>>> ambiente >>>

Progresso-dinossauro
Nova termelétrica em Camaçari anda na contramão do equilíbrio ambiental

por Marcelo Figueiredo, licenciado em Geografia pela UEFS e morador da Gleba A, Camaçari (BA)

A partir de hoje, 12 de maio, a cidade de Camaçari (BA) engrossa as contradições com o que fora acordado nos encontros mundiais sobre a questão ambiental - Rio 92, Rio +10, Copenhague -, como também com o que fora ratificado pelo Brasil em documentos oficiais como a Agenda 21 (desenvolvimento sustentável, lembram?) ou o Protocolo de Quioto. É que hoje, em nosso querido município, será inaugurada a temida Usina Termelétrica Arembepe Energia S/A. Trata-se de uma estratégia do governo federal (pasmem!), no Poloplast, situado em plena área urbana de Camaçari - rodeada, portanto, por cerca de 250 mil seres humanos e uma infinidade de riquezas naturais.

A termelétrica contradiz até mesmo a Lei Orgânica Municipal, em seu capítulo VIII, que diz: “A execução de obras, atividades, processos produtivos, instalação de industrias e empreendimentos e a exploração de produtos naturais de quaisquer espécies, quer pelo setor público, quer pelo setor privado, somente serão admitidas quando houver resguardo do meio ambiente.”

O funcionamento da Usina Arembepe Energia S/A é uma verdadeira espoliação não só com a humanidade, mas principalmente das futuras gerações de filhos e filhas camaçarienses. Vejamos o porquê:

No nosso Sistema Solar, um dos fatores indispensáveis para a existência e manutenção da vida na Terra é a existência de uma camada gasosa, chamada de atmosfera, que envolve nosso planeta em estado de relativo equilíbrio. Nessa atmosfera estão presentes diversos tipos de gases (dióxido de carbono, oxigênio, metano, ozônio, hidrogênio, argônio), responsáveis pela manutenção do efeito estufa, que mantém o calor no planeta. Todavia, o balanço térmico gerado pelo efeito estufa na Terra pode sofrer modificações em virtude da menor ou maior concentração de alguns gases presentes na atmosfera, dentre eles o dióxido de carbono (CO2) gerado no queima de combustíveis fósseis (carvão mineral e derivados do petróleo) ou na queimada de florestas.

Com a I Revolução Industrial em curso ainda na segunda metade do século XVIII na Inglaterra, a sociedade além de instituir novos padrões de produção e de consumo que vem se metamorfoseando até os dias atuais, estabeleceu uma nova relação de equilíbrio ambiental. As principais fontes de produção energética desse período esteve pautada nas usinas termelétricas, uma “instalação que produz energia elétrica a partir da queima de carvão, óleo combustível ou gás natural em uma caldeira projetada para esta finalidade específica” (Fonte: www.ambientebrasil.com.br).

Na contramão do equilíbrio ambiental, é possível afirmar que desde o século XVIII o estilo de desenvolvimento adotado pelas nações mundiais vem comprometendo o balanço térmico gerado pelo efeito estufa. A queima de combustíveis fósseis nas usinas termelétricas vem contribuindo para uma maior concentração de gases capazes de absorver calor, conduzido-nos para um cenário popularizado na última década de aquecimento global.

Em relação à problemática das mudanças climáticas, o site www.ecoos.org, diante do último grande debate mundial realizado em dezembro de 2009, em Copenhague, declara:

“Se não nos unirmos para adotar uma ação decisiva, as mudanças climáticas devastarão nosso planeta, acabando também com nossa prosperidade e nossa segurança. Os perigos têm se tornado evidentes há uma geração. Agora os fatos começam a falar por si: 11 dos últimos 14 anos foram os mais quentes já registrados, o gelo do Ártico está derretendo e a alta nos preços do petróleo e dos alimentos no ano passado é um exemplo do caos que pode estar por vir. Nas publicações científicas, a questão não é mais se os seres humanos devem levar a culpa pelo que está acontecendo, mas quão curto é o tempo que temos para reduzir danos. Até aqui, a resposta mundial tem sido fraca e sem entusiasmo.”

“Salve ó terra, por todos querida, majestosa cidade baiana, de um povo com alma aguerrida, sob o sol és a mais soberana.” (hino do município de Camaçari)

quinta-feira, 29 de abril de 2010


O jogo de cartas de Belo Monte

por Efraim Neto

De história antiga e localizada em uma das regiões de maior diversidade biológica e cultural do país, a região conhecida como Volta Grande do Xingu, UHE de Belo Monte é alvo de um jogo de cartas que parece não ter fim.

Para algumas organizações socioambientais, o maior projeto do Pacote de Aceleração do Crescimento (PAC) e grande alvo do palco político das eleições de 2010, a construção da Hidrelétrica de Belo Monte é uma resposta medíocre ao desafio de gerar energia para o país. Como assinala Washington Novaes, em artigo de 2001 no Estadão, a história da obra é antiga e até precisou mudar de nome; chamava-se Kararaô, na tentativa de vencer a polêmica que provocou ainda na década de 1980, quando foi anunciada. Na época, um estudo coordenado pela Comissão Pró-Índio apontou que a bacia do Xingu sofrerá modificações ecológicas, demográficas e econômicas que estão sendo subestimadas, ignoradas e ocultadas. O que podemos concluir das discussões de hoje: a história se repete!

Com leilão marcado para o próximo dia 20, a obra parece ser a menina dos olhos da Dilma Rousseff, a mãe do PAC. Belo Monte é uma usina hidrelétrica projetada para ser construída no Rio Xingu, no Pará, com potência instalada de 11.233MW. O lago da usina terá 516 km2 e será, segundo informa o governo, a única usina hidrelétrica no Rio Xingu. A sua construção está avaliada em 16 bilhões de reais, segundo o governo; e 22 a 30 bilhões segundo as empresas. O leilão para a definição do construtor da UHE de Belo Monte estava previsto para ocorrer em 21 de dezembro do ano passado, mas foi remarcada para abril deste ano. É neste momento que o jogo de cartas chega a um dos pontos mais críticos deste debate; quando são discutidos valores, ações, impactos e interesses.

Valores

Segundo alguns especialistas em energia, diferente das usinas Santo Antônio e Jirau, no Rio Madeira, a quantidade de energia que será produzida em Belo Monte é muito inferior. Com a capacidade instalada de 11.233MW, a usina terá apenas 4.462MW médios de energia assegurada, ou seja, 39% do potencial máximo. Em Jirau, essa relação é de 59,8%; em Santo Antônio, de 70,4%. A vazão do rio Xingu na cheia é de 23 mil m3/s, correspondendo a 4 vezes mais do que a vazão das Cataratas do Iguaçu na cheia.

A Empresa de Pesquisa Energética (EPE), estatal que planeja o setor diz que é possível erguer a terceira maior usina em potência do mundo, e determinou a sua tarifa-teto em R$ 68 por megawatt/hora, recentemente aumentada para R$ 83, pelo Tribunal de Contas da União. As empresas desejam R$ 140 por megawatt/hora. Recentemente a ex-ministra-chefe da Casa Civil da Presidência da República, Dilma Rousseff, afirmou que a participação da Eletrobrás no leilão da usina de Belo Monte tende a ser de 49% no valor total da operação. O BNDES pode vir a financiar até 80% do valor total do projeto e já possui autorização para liberar até R$ 13 bilhões de forma direta, pelas regras que limitam a utilização de até 25% do patrimônio de referência.


O Custo Direto Total (CDT) de Belo Monte já chegou até a ser modificado. Isso tudo nas últimas semanas que antecedem o leilão. Após revisão da EPE, foi aprovada pelo TCU que o canteiro de obras seja mais de quatro vezes o valor inicial, passando de R$ 640 milhões para R$ 2,85 bilhões. Antes da revisão os custos indiretos representavam 10,8% do CDT. Com a revisão, esta porcentagem passou para 22,7%.


Política


A política é o momento do jogo mais perigoso e mais desafiador. É neste momento em que vemos o quão o governo e as empresas utilizam seus contatos e influências em benefício próprio e de uma minoria, obviamente para a manutenção de suas esferas de domínio e ação. Para a construção de Belo Monte, a estratégia seria juntar 12 empresas inscritas na chamada pública da Eletrobras em consórcios capitaneados cada um por uma subsidiária da empresa (Furnas, Chesf, Eletronorte e Eletrosul). Entretanto, dessas 12 empresas habilitadas, poucas têm condições concretas de formar um consórcio competitivo. E para complementar o tempero da jogatina, desistiram de se associar às Centrais Elétricas Brasileiras S.A e também de participar do leilão, a Camargo Corrêa e Odebracht, a CPFL (controlada pela Camargo Corrêa) e a Suez. O então presidente da EPE, Maurício Tolmasquim, andou dizendo na imprensa que a própria participação da Camargo Corrêa e Odebrecht no leilão ainda não é uma carta fora do baralho. A pergunta que nos resta é: O que o governo esconde em suas mangas?

No primeiro dia de fevereiro deste ano, o IBAMA concedeu a licença prévia para a construção da usina. E desde então foi possível perceber um “oba oba” governamental sobre os esforços do órgão e papel do ex-ministro do meio ambiente, Carlos Minc, em conseguir a licença. Este ato se tornou muito visível quando no último dia 31 de março, o presidente Lula elogiou o ex-ministro, em sua despedida do ministério, sobre os seus esforços.

Pouco dias depois da divulgação da licença prévia, o Ministério Público Federal, por meio de uma ação civil púbica, entra com processo contra o leilão de Belo Monte. O MPF argumentou que houve desrespeito à Constituição Federal e à Legislação Ambiental, com falhas na elaboração dos estudos de viabilidade ambiental da obra, principalmente em relação aos impactos sobre a qualidade da água e a manutenção da biodiversidade e das populações ribeirinhas e indígenas. A sua aprovação, na última quarta-feira, 14, ordenou que o IBAMA se abstenha de emitir nova licença, que a Aneel se abstenha de fazer novo edital e que sejam notificados o BNDES e as empresas que possuem interesse em participar do leilão. A multa para o descumprimento da determinação judicial será de R$ 1 milhão. Essa foi uma jogada forte contra o governo, mas já derrubada pela Advocacia Geral da União (AGU).

Poucos dias após essas movimentações, a vice-procuradora-geral da República, Deborah Duprat, solicitou, pela segunda vez, ao presidente do BNDES, Luciano Coutinho, que informasse num prazo de dez dias qual o volume de recursos que o banco dispõe para financiar os empreendimentos do setor elétrico, em especial Belo Monte. Em sua reposta, o BNDES informa que “desconhece os detalhes do empreendimento do projeto da UHE Belo Monte, fato esse que somente ocorre após a apresentação do pedido de financiamento da eventual beneficiária que resultará do leilão a ser promovido pelo poder concedente”.


É interessante ressaltar que a AGU ameaçou processar os procuradores federais do Pará que questionaram a licença na Justiça. Acrescido a isso no dia 16, a limitar foi derrubada e a Aneel anunciou que está mantido o leilão para a próxima terça-feira, dia 20. Isso ocorreu após a Aneel anuncia o cancelamento do leilão. Essa é a grande prova de que a Presidência necessita fazer sua propaganda, qualificar o PAC e anunciar que deixou um forte plano energético para que país não passe por outro apagão como ocorreu no governo FHC. Chamemos isso de joga baixa.


Ainda faz parte desta obscura jogada as propostas feitas pelo setor privado, que colocou na mesa sugestões para compensação, entre as quais: um Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento da Infraestrutura (Reidi), maior do que o já ofertado; em cronograma para a geração mais alongada do que previsto hoje; e limites para os riscos ambientais geológicos assumidos pelas empresas. Entretanto, nada muito específico ou com número e prazos fixados.


Segundo informou o Governo, a distribuição de energia de Belo Monte será da seguinte maneira: 70% irá para o mercado das distribuidoras; 20%, para os grandes consumidores de energia; e 10% poderão ser negociados com os chamados consumidores leves.


Para finalizar esse item, aponto que a Funai, ainda no ano passado, concedeu autorização para a construção da UHE de Belo Monte sem consultar as mais de 28 etnias indígenas que vivem na região, demonstrando interferência política no processo técnico de avaliação dos impactos.

Impactos

O local de construção da UHE Belo Monte é constituído por 51.600 hectares de florestas, com um espelho d’água de 516 km2. A concepção dessa obra da engenharia civil proporcionará o desvio do rio com a construção de dois canais de 500 m de largura e 30 km de comprimento, deixando 100 km de leito seco, submergindo a Volta Grande do Xingu e um terço do município de Altamira. Acrescido a isso, e por mais que o governo prometa que seja apenas a única hidrelétrica no rio (e há em nossa política a mania de prometer e não cumprir), para que Belo Monte apresente um grau de eficiência energética compatível com as recomendações técnicas, seria necessária a construção de outras três hidrelétricas na bacia do Xingu, que teriam que regular a vazão do rio. Apenas por ora a construção dessas usinas foi descartada pelo governo porque estão projetadas para o coração da bacia, onde 40% das terras pertencem aos indígenas.


Até o início do funcionamento das primeiras bobinas, em 2015, está previsto um fluxo de 100 mil pessoas para a região da Volta Grande do Xingu. Uma ação que por si só já gerará prejuízos socioambientais sem precedentes. Para a construção da UHE Belo Monte serão retirados 210 milhões de m2 de pedra e terra, o que corresponde a um volume maior do a do Canal do Panamá. Também serão desmatados 50 mil hectares em zona de mata em pleno coração da Amazônia. Infelizmente a licença prévia permite a realização do leilão de Belo Monte, ainda sem que importantes impactos tenham sido identificados. Para mitigar os efeitos ambientais da construção da obra, o IBAMA apontou 40 condicionantes para aliviarem os imensos impactos socioambientais de Belo Monte. Vale lembrar que na Transposição do São Francisco o órgão apontou 30 condicionantes; nenhuma foi cumprida.

Para finalizar, segundo o Instituto Socioambiental, o Parecer Técnico nº 114/2009, de 23 de novembro de 2009, que não está disponível no site do IBAMA, expõe que “tendo em vista o prazo estipulado pela Presidência, esta equipe não concluiu sua análise a contento. Algumas questões não puderam ser analisadas na profundidade apropriada, dentre elas as questões indígenas e as contribuições das audiências públicas. Além disso, a discussão interdisciplinar entre os componentes desta equipe ficou prejudicada. Essas lacunas refletem-se em limitações neste Parecer”.


O que nos resta agora é aguardar o leilão e o final dessa jogatina; e torcer para que os impactos socioambientais sejam os menores possíveis. Porque não são mais inevitáveis. Infelizmente neste jogo de cartas sempre ganha quem esconde cartas nas magas. Mas quem perde é a sociedade; a logo prazo.


Veja também:

Belo Monte: ora, as leis

Carta Movimento


Filme – Povos do Xingu